segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Historia da Igreja I

1. O terreno onde a semente foi plantada
Há quase dois mil anos, o mundo mediterrânico era controlado por Roma. O Grande Império estendia-se da Síria até Portugal, das Ilhas Britânicas até o Egipto. Fundado pelo génio de Octávio Augusto, que soube concentrar em suas mãos o poder sem destruir as aparências da República, o Império vivia, no início da nossa era, um período de paz e prosperidade (Pax Romana).
O helenismo pela via do estoicismo e do platonismo e dos costumes influenciava o pensamento do mundo mediterrânico e estimulava o gosto pelas coisas espirituais. Uma grande efervescência religiosa atingia todas as camadas da sociedade. O panteão romano, retocado pelo Olimpo grego, conservava o seu prestígio e contava com inúmeros fiéis devotos. Mas existiam outras correntes em desenvolvimento. Pregadores vários anunciavam os seus deuses em cada canto do Império. Vindos do Egipto, através de Alexandria, chegavam os mistérios de Ísis e de Serápis. Os fenícios adoravam os seus baalins. Em Roma, havia o culto sensual da deusa Cibele, mãe de Pessinonte. O orfismo afirmava a existência de mediadores entre Deus e os homens; para os pitagóricos, um Logos. As almas mais inquietas e sedentas de eternidade voltavam-se para os mistérios de Mitra, o deus-sol dos arianos, cujo culto se fortalecia com a astrolatria caldeia. Uma enorme diversidade de sincretismos e superstições pululava por toda a parte.
Trazido do Oriente, desenvolvido pelos sucessores de Alexandre Magno, o culto ao soberano implantou-se no Império. Quando morria um imperador, logo surgia um culto oficial à sua divindade. Nas províncias orientais, porém, o imperador era adorado ainda em vida.
No meio dessa babel de crenças, um povo fazia questão de manter-se fiel a um só Deus, fugindo de toda contaminação pagã. Na Diáspora ou na Palestina, o pequeno povo de Israel jamais havia esquecido a fé dos antepassados, Abraão, Isaac e Jacob, e de como Yahweh os tinha libertado da escravidão no Egipto. Tinha consciência do seu status superior, de ser uma raça escolhida e predestinada por Deus, herdeira das promessas divinas.
Entre Yahweh e o seu povo havia um laço, a Torá, a Lei que Moisés recebera no monte Sinai e que tinha de ser observada zelosamente. A Lei era uma colectânea de preceitos éticos e religiosos fixados em um conjunto de cinco livros sagrados, o Pentateuco. Ao lado do Pentateuco existiam outros livros, de cunho histórico, profético, poético, salmos... A sua colecção formava as Escrituras Sagradas do judaísmo.
Na época de Jesus ainda não havia um cânone fixo das Escrituras. Só depois, no final do século III, surgirá uma definição mais rigorosa. Ao lado dos livros, havia entre os judeus uma tradição oral, transmitida de pai para filho. O sinédrio, tendo a frente o Sumo Sacerdote, e os escribas, era o responsável pela guarda da Lei. Jerusalém, a cidade sagrada, e seu templo, eram o centro da religiosidade dos judeus.
Fora da Palestina, o judaísmo alexandrino começava a assimilar elementos do platonismo e do estoicismo. Fílon de Alexandria (13 a.C. a 54 d.C.) construiu um sofisticado sistema teológico e filosófico que integrava as Escrituras com certas correntes do pensamento grego. Tal movimento influenciava profundamente as comunidades judias da Diáspora e preparava o caminho para o desenvolvimento da teologia cristã.
Na Terra Santa, qualquer tentativa de assimilação com o helenismo era fortemente repelida. Antíoco Epífanes teve a ousadia de colocar um Júpiter olímpico no templo de Jerusalém e por isto enfrentou a ira dos Macabeus. Uma verdadeira guerra santa. Mesmo quando Roma reduziu Israel à condição de simples vassalo, o povo de Deus se apegou mais ainda à fé de seus pais e se uniu aos fariseus, sucessores dos piedosos (hasidim) da época dos Macabeus.
Os fariseus tinham uma espiritualidade centrada na meditação e no cumprimento da Torá. Para eles o pai judeu que ensinasse grego ao seu filho era maldito. Impunham uma rígida observância do Sábado. Cuidavam para que os menores mandamentos fossem sempre respeitados. Acreditavam na imortalidade da alma, na ressurreição, na existência de anjos, contrariando os ensinamentos dos saduceus, os quais só reconheciam o Pentateuco.
Os zelotas, rebeldes que combatiam a dominação romana pela luta armada, encarnavam o nacionalismo judeu em sua forma mais fanática e intransigente. Os essénios, segundo Flávio Josefo, estabeleciam-se em várias cidades e eram numerosos. A comunidade essénica de Qumran diferenciava-se pelo seu estilo de vida cenobítico. Os Manuscritos do Mar Morto, encontrados recentemente, nos deram mais informações sobre este grupo em particular.
"Quando, porém, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei..." (Gal 4,4).

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