quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Historia da Igreja XVII

17. Tolerância e crescimento
Constantino protegeu a Igreja, mas não foi linear nessa protecção. Por vezes era dúbio e recuava tacitamente. Porém, promoveu a sua divulgação e organização. A expensas suas reuniu sínodos (reuniões de bispos por afinidades regionais), suportou as suas viagens e demais necessidades.
No decurso do século IV o Cristianismo começou a ser tolerado pelo Império, para alcançar depois um estatuto de liberdade e converter-se finalmente, no tempo de Teodósio, em religião oficial do Estado. O Imperador romano, por esta época, convocou as grandes assembleias dos bispos, os concílios, e a Igreja pôde então dar início à organização de suas estruturas territoriais.
A religião cristã na região do Mediterrâneo foi organizada sob cinco patriarcas: os bispos de Jerusalém, Antioquia, Alexandria, Constantinopla e Roma. As antigas comunidades cristãs foram, então sucedidas pela sociedade cristã, o cristianismo passou de religião das minorias para então se tornar em religião das multidões: chegara a cristandade.
Com a decadência do Império os bispos pouco a pouco foram assumindo funções civis de carácter supletivo e a escolha do bispo passou a ser mais por escolha do clero do que pela pequena comunidade, segundo fórmulas antigas. Por essa época não foram poucas as intervenções dos nobres e imperadores nas suas escolhas.
Figuras expressivas da vida civil foram alçadas à condição de bispo, exemplo disto foram Santo Ambrósio, governador da Alta Itália que passou a bispo de Milão; São Paulino de Nola, ex-cônsul e Sidônio Apolinário, genro do imperador Avito e senhor do Sul das Gálias, que foi eleito bispo de Clermont-Ferrand.
Antes de findar o século IV o Concílio de Niceia (325) e o Primeiro Concílio de Constantinopla, em respostas às heresias arianas e ao macedonismo, formularam a doutrina da Trindade que ficou fixada no seu conjunto no "Símbolo niceno-constantinopolitano".
Por esta época colocou-se a questão da humanidade e divindade de Cristo que ficou definida no Concílio de Éfeso, convocado pelo imperador Teodósio II, que afirmou que Cristo é "perfeito Deus e perfeito homem" e definiu Maria como "Aquela que levou Deus" (Theotokos) em resposta à heresia Nestoriana (do bispo Nestório) que lhe atribuía apenas o Christotokos (Aquela que levou Cristo).
Esta posição depois foi reafirmada no Concílio de Calcedónia (451) e no Terceiro Concílio de Constantinopla (680).

Historia da Igreja XVI

16. A influência da Igreja
No ano de 391, a religião cristã foi transformada em religião oficial do Império Romano. A partir deste momento, a Igreja Cristã começou a organizar-se e ganhar força no continente europeu. Nem mesmo a invasão dos povos bárbaros (germânicos) no século V atrapalhou o crescimento do Cristianismo.
Durante a Idade Média (século V ao XV) a Igreja Católica conquistou e manteve grande poder. Possuía muitos terrenos (poder económico), influenciava as decisões políticas dos reinos (poder político), interferia na elaboração das leis (poder jurídico) e estabelecia padrões de comportamento moral para a sociedade (poder social).
Como religião única e oficial, a Igreja Católica não permitia opiniões e posições contrárias aos seus dogmas (verdades incontestáveis). Aqueles que desrespeitavam ou questionavam as decisões da Igreja eram frequentemente perseguidos e punidos. Na Idade Média, a Igreja Católica criou o Tribunal do Santo Ofício (Inquisição) no século XIII, para combater os hereges (contrários à religião católica). A Inquisição prendeu, torturou e mandou para a fogueira milhares de pessoas que não seguiam às ordens da Igreja.
Por outro lado, alguns integrantes da Igreja Católica foram extremamente importantes para a preservação da cultura. Os monges copistas dedicaram-se a copiar e guardar os conhecimentos das civilizações antigas, principalmente, dos sábios gregos. Graças aos monges, esta cultura se preservou, sendo retomada na época do Renascimento Cultural.
Enquanto parte do alto clero (bispos, arcebispos e cardeais) se preocupava com as questões políticas e económicas, muitos integrantes da Igreja Católica colocavam em prática os fundamentos do Cristianismo. Os monges franciscanos, por exemplo, deixaram de lado a vida material para dedicarem-se aos pobres.
A cultura na Idade Média foi muito influenciada pela religião católica. As pinturas, esculturas e livros eram marcados pela temática religiosa. Os vitrais das igrejas traziam cenas bíblicas, pois era uma forma didática e visual de transmitir o Evangelho para uma população quase toda formada por analfabetos. Neste contexto, o papa São Gregório (papa entre os anos de 590 e 604) criou o canto gregoriano. Era uma outra forma de transmitir informação e conhecimentos religiosos através de um instrumento simples e interessante: a música.

Historia da Igreja XV

15. O Edito de Milão
Entrando vencedor em Roma, Constantino foi bem acolhido pelo povo e pelos mais abastados. Mandou matar um filho de Maxêncio e alguns de seus amigos. Reparou os aquedutos com dinheiro do próprio bolso. Aceitou sem problemas a bajulação e as honras "divinas" dos seus súbditos pagãos, autorizando inclusive a construção de um templo e a fabricação de uma estátua a si dedicados. A transição da tolerância para a intolerância diante do paganismo será lenta.
Mandou fazer nas moedas o monograma XP e enviou uma carta a Maximino Daia "convidando-o" a suspender a perseguição. No Inverno de 312-313, o tesouro contribuiu para que fossem reconstruídos os edifícios de culto e o papa Milcíades obteve de Fausta o palácio de Latrão.
No começo do ano 313 Constantino encontrou-se com Licínio em Milão (Licínio acabara de se casar com Constança, irmã de Constantino). Durante dois meses eles conversam sobre diversos pontos de suas políticas e, particularmente, sobre como deveria ficar a situação do Cristianismo. Destas conversações nasceu um acordo que hoje conhecemos como o "Edito de Milão".
Não se trata de nenhum documento especial, mas de um conjunto de cartas de Constantino e Licínio que afirmam o princípio da liberdade religiosa e, por conseguinte, dão aos cristãos pleno direito de professar sua fé "sem receio de ser incomodados".
A Igreja, oficialmente reconhecida, passa a ter direitos: seus lugares de culto, destruídos ou confiscados, devem ser restituídos. As propriedades devem retornar para as mãos dos seus donos cristãos. O Cristianismo fica em pé de igualdade com o paganismo, uma religião "lícita". Licet esse Christianos.
Logo chegará o momento, porém, em que o paganismo será definitivamente suplantado pelo Cristianismo.

Historia da Igreja XIV

14. Constantino vencedor
Nascido na Sérvia, por volta do ano 280, Constantino estava destinado a mudar o rumo da História. Filho de Constâncio Cloro e de Helena, educado na corte de Diocleciano, depois de passar longos tempos junto de Galério, o que não lhe agradava muito, afastou-se quando o seu pai o chamou para uma expedição na Inglaterra.
Alma complexa, reunia em si características contraditórias: ora vigoroso e impetuoso, ora desanimado e influenciável. Às vezes cheio de generosidade e clemência, outras violento e sanguinário, impiedosamente cruel. Humilde e orgulhoso, instável, instintivo, supersticioso. Foi de um ser humano assim que a Providência se quis servir para dar a vitória à Igreja.
Depois que Constâncio Cloro morreu, em 306, as legiões o proclamaram Augusto. Galério, no entanto, fez dele apenas um César. Constantino passou a ser o detentor de todo o poder no Ocidente, provocando a inveja de Maxêncio, filho de Maximiano.
Constantino se casou com Fausta, irmã de Maxêncio. Advertido por sua esposa de que o sogro (Maximiano) armava uma conspiração para matá-lo, deu um jeito de encontrarem o ex-Augusto enforcado numa prisão.
Em 311, após a morte de Galério, a situação de Roma ficou assim: no Oriente, Maximino Daia e Licínio, no Ocidente, Maxêncio e Constantino.
Maxêncio e Constantino não estavam dispostos a dividir o poder.
Maxêncio, o Augusto, declara-se o único soberano legítimo e sucessor dos imperadores. Em 312, Constantino parte para a batalha. 40 mil do seu lado contra 100 mil de Maxêncio. O filho de Constâncio cruza os Alpes e toma várias cidades italianas. Em 27 de Outubro de 312 já avista de longe a Cidade Eterna. Um dia depois, as tropas do seu inimigo atravessam o Tibre pela ponte de Mílvio. O confronto é despoletado e as tropas de Constantino saem vitoriosas. O exército de Maxêncio foge em debandada, enquanto este último perece no meio da confusão.
Durante a batalha, Constantino adere ao Cristianismo. Segundo alguns invocou Jesus Cristo e por isto obteve a vitória. Para Lactâncio, Constantino teve um êxtase no qual recebeu a ordem de colocar sobre o escudo de suas tropas um sinal formado pelas letras gregas X (chi) e P (rô), iniciais de Cristo. De fato, tal monograma foi encontrado em moedas e inscrições constantinianas.
Eusébio de Cesaréia refere-nos outra versão. Instantes antes de enfrentar Maxêncio, o Imperador apelou para o Deus dos cristãos, que lhe respondeu através de um sinal celeste: uma cruz luminosa acompanhada da frase: "Com este sinal vencerás". Na noite seguinte, Jesus lhe apareceu e pediu que fizesse da cruz uma insígnia, o Labarum.
Desde então os exércitos de Constantino usaram o Labarum como estandarte.
Para alguns, a "conversão" de Constantino foi apenas uma jogada política, uma tentativa de atrair para o Império a força do Cristianismo. No entanto, tal tese é muito simplista. Como a maioria das pessoas da sua época, Constantino tinha obsessão pelo sobrenatural e era muito crédulo. Talvez tenha sido movido pelo medo de um fim trágico, que aguardava todos os que se opunham ao cristianismo. De qualquer jeito, nunca saberemos com certeza o que levou o jovem e impetuoso soldado a render-se diante do Crucificado. Resta-nos apenas a constatação dos factos e de suas consequências.

Historia da Igreja XIII

13. O algoz se curva diante da cruz
Quando a perseguição de Diocleciano chega ao seu apogeu acontece algo inesperado. No primeiro dia de Março de 305 os dois Augustos, Diocleciano e Maximiano, renunciam ao seu posto, deixando seus lugares para os dois Césares, Galério e Constâncio Cloro.
Constâncio Cloro, senhor do Ocidente, era muito tolerante. Quando assumiu o poder, "as regiões situadas além da Ilíria, ou seja, a Itália inteira, a Sicília, a Gália e todos os países do Ocidente, a Espanha, a Mauritânia e a África, depois de terem sofrido a violência da guerra durante os primeiros anos da perseguição, prontamente obtiveram da graça divina o benefício da paz" (Eusébio de Cesaréia).
O Oriente, no entanto, teve de enfrentar a ira do César Maximino Daia, instigado por Galério. Em 306 foi publicado um édito que obrigava todos os súbditos a sacrificarem aos deuses. No Egipto a perseguição foi tão terrível que muitos cristãos, para fugir da desonra, cometeram suicídio. Os que não morriam eram submetidos a grandes vexações: as mulheres eram entregues à prostituição, os homens condenados a trabalhos forçados nas pedreiras e nas minas.
Maxêncio, em Roma, foi tolerante. Licínio, que governa as províncias do Danúbio, também não perseguiu os cristãos. Constantino, filho de Constâncio, não tem a menor intenção de atacar a Igreja de Jesus.
Aos poucos o sistema da tetrarquia irá-se-á arruinando. Lutas pelo poder, legiões revoltadas, batalhas... Os mesmos males que afligiram o Império no século anterior ressurgirão com vigor. A Igreja atravessará uma tempestade e tanto, dependendo da índole do Augusto que estiver no poder. Frequentemente a tolerância trocará de lugar com a perseguição. No período que vai do ano 305 até o ano 324, não haverá paz no Império.
Em 311, Galério, levado por uma terrível doença e por remorsos, assina um édito, rubricado por Licínio e Constantino, encerrando a perseguição no Oriente: primeiro grande triunfo do testemunho dos mártires e prenúncio de novos tempos para a Igreja.
Maximino Daia, a contragosto, liberta os prisioneiros cristãos. Quando Galério morrer, poderá descarregar novamente sua fúria. Medidas discriminatórias, panfletos cheios de calúnias, confissões forjadas, todos os meios serão por ele utilizados para destruir a Igreja. Mas o tempo mostrará a inutilidade de seus esforços.

Historia da Igreja XII

12. Os sacramentos no século III
Sobre a liturgia deste período, temos várias fontes. Hipólito, na sua Tradição Apostólica, fala sobre o baptismo, a eucaristia, a ordenação... Vejamos como era:

Baptismo – Confirma-se claramente a existência do baptismo de crianças. Logo ao amanhecer, ora-se sobre a água que vai ser usada no baptismo. O sacerdote ordena a cada um dos catecúmenos que renuncie a Satanás. Os que renunciam são ungidos com o óleo do exorcismo, consagrado pelo bispo. Depois, na água, aquele que baptiza pergunta ao catecúmeno se este crê no Pai, no Filho e no Espírito Santo (profissão de fé já parecida com o símbolo apostólico actual), mergulhando-o a cada resposta afirmativa. Quando saem da água, os neófitos são ungidos com o óleo de acção de graças. Todos se vestem e se dirigem para a igreja, onde recebem a imposição de mãos do bispo e são ungidos (Crisma). Depois de marcar o neófito na testa, o bispo dá-lhe um beijo e diz: "O Senhor esteja contigo". O que foi marcado responde: "E com o teu espírito". Todos tomam parte na assembleia depois que recebem o sacramento da Confirmação.

Eucaristia – Os diáconos apresentam a oblação ao bispo, que impõe as mãos sobre ela e diz, com o presbitério: "O Senhor esteja convosco". A assembleia responde: "E com teu espírito".
"Elevai vossos corações. - Nós os temos voltados para o Senhor. - Demos graças ao Senhor. - É digno e justo". O bispo prossegue dando graças a Deus e lembrando os feitos da História da Salvação (oração eucarística). Invoca o Espírito Santo sobre a oblação e repete as palavras de Jesus na última ceia.

Ordenação – O bispo deve ser irrepreensível e é eleito pela comunidade. Feita a escolha, o povo se reúne com o presbitério e outros bispos presentes. Os bispos impõem as mãos sobre aquele que vai ser ordenado, enquanto o presbitério fica imóvel. Todos ficam em oração pedindo a descida do Espírito Santo. Um dos bispos, escolhido por todos, impõe as mãos sobre o que está sendo ordenado e faz uma oração, lembrando os sacerdotes da antiga Aliança e pedindo a vinda do Espírito Santo. Pede para o novo bispo o poder sacerdotal, o poder de oferecer a eucaristia, perdoar os pecados, dirigir a comunidade, ligar e desligar, pastorear com sabedoria e pureza o rebanho que lhe é confiado.
O clero compreende sete classes: bispos, diáconos, subdiáconos, acólitos, leitores, exorcistas e ostiários. Esta divisão, porém, não é rígida, e não exclui a possibilidade de uma pessoa desempenhar mais de uma função.

Penitência – A penitência é pública, e a reparação depende da gravidade do pecado cometido.
A Didascália, documento dos primeiros decénios do século III, prescreve um jejum de seis dias antes da Páscoa.

Historia da Igreja XI

11. Expansão do Cristianismo no século III — "A terceira raça"
Enquanto o Império começava sua lenta agonia a Igreja crescia cada vez mais. Havia cristãos na Britânia e na Espanha, no Egipto e no Danúbio, na Ásia Menor, na Grécia, na Trácia, na Macedónia. Há também alguns em Aelia Capitolina, construída sobre as ruínas de Jerusalém. As cidades costeiras da Síria possuem grande quantidade de cristãos.
Por volta do ano 200, Abgar IX, rei de Osreone, converte-se ao Cristianismo. Na Gália, Santo Ireneu havia dado início a uma grande obra de evangelização. Fora das fronteiras do Império, na Mesopotâmia, na Pérsia, na Etiópia e até na Índia chegam pregadores do Evangelho. Povos bárbaros, como os germanos e os godos, receberam a semente da Boa Nova. O desabrochar destas sementes, no entanto, só acontecerá a longo prazo.
A maioria dos cristãos continua a ser de classe baixa, o que é motivo de zombaria para os detractores da nova fé. Mas cada vez mais gente de nível económico e social "respeitável" começa a entrar em suas fileiras.
Em Alexandria, fundada por Panteno, filósofo estóico convertido ao Cristianismo, ainda no segundo século, uma escola teológica e catequética começava a desenvolver-se. Clemente, Orígenes, Atanásio e Cirilo serão seus representantes mais significativos
Opondo-se às tendências alegóricas e especulativo-filosóficas da escola de Alexandria, surgirá, no séc. III, a escola de Antioquia, intensamente dedicada à exegese bíblica. O seu fundador, acredita-se, é o presbítero Luciano de Samósata (+ c. de 312).
A hinologia dos primeiros séculos não deixou muitos vestígios. Temos o canto vespertino Phos hilarón e o matutino Dócsa en upsístois theo, o nosso Gloria in excelsis Deo. Alguns papiros que foram descobertos traziam cânticos cristãos, um deles com notas musicais. As Odes de Salomão são uma colecção de cantos gnósticos do século II.
Com o crescimento numérico, começou a haver um certo relaxamento entre os cristãos. À medida que recrudescia a perseguição, surgiam mais e mais casos de apostasia.
Tertuliano afirma no Apologeticum que existem cristãos exercendo funções militares. Mais tarde, porém, quando se tornar montanista, ensinará que um seguidor de Jesus não pode servir no exército. Hipólito, em sua Tradição Apostólica, apresenta uma lista de profissões proibidas para os cristãos: soldado, sacerdote de ídolos e magistrado. O militar que deseja se converter não pode mais matar nem fazer juramentos.
No momento em que o Cristianismo se tornar a religião oficial do Império, essas restrições vão desaparecer. Haverá, no entanto, um rito de purificação para o soldado que tiver derramado sangue.
Começam a ser construídas as primeiras igrejas a partir da metade do século III. A casa-igreja de Dura Europos, às margens do Eufrates, é o mais antigo edifício de culto cristão que se conhece (c. de 250). Em suas paredes existem vários frescos com temas bíblicos. Nas catacumbas de Priscila, em Roma, temos um fresco com a Virgem e o menino Jesus nos braços (começo do séc. III). A iconografia cristã se desenvolve rapidamente.
Os sínodos, ou concílios locais, que já se realizavam no século anterior, consolidam-se e se tornam um meio eficaz para garantir a unidade da Igreja.
Diante dos pagãos e dos judeus, os cristãos formavam o que Santo Agostinho chamava de "tertium genus", a "terceira raça".

Historia da Igreja X

10. Crise do Império
Ao longo do século III o Império será na maior parte do tempo uma ditadura militar. A instabilidade política foi grande. Os exércitos, formados não por romanos mas principalmente por mercenários, isto é, gente vinda de províncias conquistadas há pouco tempo, põem e depõem os imperadores pelos mais variados motivos: dinheiro, inveja, medo, aversão pela disciplina...
Uma crise económica devastou o Império: explodem guerras civis aqui e ali (onde está a Pax Romana?); as fronteiras são áreas de combate contínuo (primeiras invasões bárbaras); as estradas são quase abandonadas; há escassez de comida; os salteadores formam quadrilhas; o mar fica cheio de piratas; a inflação devora a moeda (medidas desesperadas, como o tabelamento de preços, são tomadas pelo governo); a corrupção é generalizada; a luxúria e a devassidão corroem a família; até mesmo a arte e a literatura perdem o brilho (temos alguns nomes, desconhecidos para a maioria dos nossos contemporâneos: Terêncio Escauro, Suplício Apolinário, Ácron, Censorino, Mário Máximo, Plócio Sacerdote; juristas como Papiniano, Ulpiano e Paulo se destacam; em grego: Díon Cássio, Diógenes Laércio e o maior de todos, Plotino, chefe do neoplatonismo; seu discípulo, Porfírio, escreveu um tratado Contra os Cristãos). Decadência: esta é a palavra que descreve melhor o Imperium nesses tempos.
A astrologia caldeia e o mitraísmo estabelecem-se fortemente: "Se, no seu nascimento, o Cristianismo tivesse sido detido no seu progresso por alguma doença mortal, o mundo teria se convertido aos mistérios de Mitra", disse Renan. E até certo ponto é verdade.
O neoplatonismo é um misto de filosofia e religião que vai se opor frontalmente à fé cristã. Juntamente com o restante do paganismo e todos os sincretismos que possam ser imaginados, estas doutrinas infectavam o Imperium, e só encontravam um obstáculo consistente e sólido: a Igreja.

Historia da Igreja IX

9. Difusão do Cristianismo no século II
No final do século II existem cristãos espalhados em todos os lugares do mundo romano. No Oriente (Ásia Menor, Síria, Palestina) a concentração de fiéis é maior, inclusive fora das cidades. No Ocidente, o progresso da evangelização é desigual. O Evangelho penetrou profundamente na Itália Central, no sul da Espanha, no norte da África. Na Ilíria, na Itália do Norte e na Gália a presença é menor.
Fora do Império existiam cristãos no reino de Edessa e no Império Persa.

Historia da Igreja VIII

8. Perseguições do século II — A gesta dos mártires
Os Antoninos, Adriano (117-138), Antonino Pio (138-161) e Marco Aurélio (161-180) não fizeram mudanças na legislação anticristã. Esporadicamente eclodiam novas perseguições e a Igreja ganhava novos mártires. Muitas vezes era a turba que, fanatizada, levada pela inveja ou pelo patriotismo, denunciava e entregava os cristãos ao poder público.
Na Gália temos os mártires de Lyon, em 177. Uma revolta popular arrastou para a morte cinquenta cristãos, entre eles Potino, o bispo, que contava na ocasião 90 anos, o diácono Sanctus e a escrava Blandina. Esta última suportou com incrível coragem inúmeros tormentos antes de entrar no repouso de Cristo. Depois de queimarem os corpos dos mártires, lançaram suas cinzas no Ródano. Os algozes comentavam, em tom de zombaria: "Vejamos se agora o seu Deus os ressuscita".
Em Roma temos a pequena Cecília, jovem, de família nobre, quis consagrar-se a Cristo e fez voto de virgindade. O cutelo do carrasco precisou ser usado várias vezes antes de conseguir tirar-lhe a vida. Também muitos papas morreram mártires ao longo do século II.
Em Scili, na África, doze fiéis foram presos. O interrogatório ao qual foram submetidos ficou registado para a História. Todos receberam a coroa do martírio.
Não se deve imaginar, no entanto, que os mártires não tinham medo das torturas e da morte. Muitos cristãos preferiram renegar a própria fé, caindo na apostasia, a morrer por Cristo.
Porém, "o sangue dos mártires é semente de cristãos" (Tertuliano). A coragem dos que preferiam o Senhor à própria vida ajudava na propagação da fé.

Historia da Igreja VII

Chamamos de “Padres da Igreja” (Patrística) aqueles grandes homens da Igreja, aproximadamente do século II ao século VII, que foram no oriente e no ocidente como que “Pais” da Igreja, no sentido de que foram eles que firmaram os conceitos da nossa fé, enfrentaram muitas heresias e, de certa forma foram responsáveis pelo que chamamos hoje de Tradição da Igreja; sem dúvida, são a sua fonte mais rica. Certa vez disse o Cardeal Henri de Lubac: “Todas as vezes que, no Ocidente tem florescido alguma renovação, tanto na ordem do pensamento como na ordem da vida – ambas estão sempre ligadas uma à outra – tal renovação tem surgido sob o signo dos Padres”.

Gostaria de apresentar aqui ao menos uma relação, ainda que incompleta, desses gigantes da fé e da Igreja, que souberam fixar para sempre o que Jesus nos deixou através dos Apóstolos. Em seguida, vamos estudar um pouco daquilo que eles disseram e escreveram, a fim de que possamos melhor conhecer a Tradição. Alguns foram Papas, nem todos; a maioria foi bispo, mas há diáconos, presbíteros e até leigos. Entre eles muitos foram titulados de Doutor da Igreja, sempre por algum Papa, por terem ensinado de maneira extraordinária os dogmas e verdades da nossa fé. Ao todo os Doutores da Igreja até hoje são 33; 30 homens e 3 mulheres, mas nem todos da época da Patrística.
Vamos apresentar a seguir uma síntese dos principais Padres da Igreja:
S. Clemente de Roma (†102), Papa (88-97), foi o terceiro sucessor de São Pedro, nos tempos dos imperadores romanos Domiciano e Trajano (92 a 102). No depoimento de Santo Ireneu, “ele viu os Apóstolos e com eles conversou, tendo ouvido diretamente a sua pregação e ensinamento”. (Contra as heresias)
Santo Inácio de Antioquia (†110) foi o terceiro bispo da importante comunidade de Antioquia, fundada por São Pedro. Conheceu pessoalmente São Paulo e São João. Sob o imperador Trajano, foi preso e conduzido a Roma onde morreu nos dentes dos leões no Coliseu. A caminho de Roma escreveu Cartas às igreja de Éfeso, Magnésia, Trales, Filadélfia, Esmirna e ao bispo S. Policarpo de Esmirna. Na carta aos esmirnenses, aparece pela primeira vez a expressão “Igreja Católica”.
Aristides de Atenas († 130) foi um dos primeiros apologistas cristãos; escreveu a sua Apologia ao imperador romano Adriano, falando da vida dos cristãos.
São Policarpo (†156) foi bispo de Esmirna, e uma pessoa muito amada. Conforme escreve Santo Irineu, que foi seu discípulo, Policarpo foi discípulo de São João Evangelista. No ano 155 estava em Roma com o Papa Niceto tratando de vários assuntos da Igreja, inclusive a data da Páscoa. Combateu os hereges gnósticos. Foi condenado à fogueira; o relato do seu martírio, feito por testemunhas oculares, é documento mais antigo deste gênero (publicado neste livro).
Hermas (†160) era irmão do Papa São Pio I, sob cujo pontificado escreveu a sua obra Pastor. suas visões de estilo apocalíptico.
Didaqué (ou Doutrina dos Doze Apótolos) é como um antigo catecismo, redigido entre os anos 90 e 100, na Síria, na Palestina ou em Antioquia. Traz no título o nome dos doze Apóstolos. Os Padres da Igreja mencionaram-na muitas vezes. Em 1883 foi encontrado um seu manuscrito grego.
São Justino (†165), mártir, nasceu em Naplusa, antiga Siquém, em Israel; achou nos Evangelhos “a única filosofia proveitosa”. Filósofo, fundou uma escola em Roma. Dedicou a sua Apologias ao Imperador romano Antonino Pio, no ano 150, defendendo os cristãos; foi martirizado em Roma.
Santo Hipólito de Roma (160-235), discípulo de Santo Ireneu (140-202), foi célebre na Igreja de Roma, onde Orígenes o ouviu pregar. Morreu mártir. Escreveu contra os hereges, compôs textos litúrgicos, escreveu a Tradição Apostólica onde retrata os costumes da Igreja no século III: ordenações, catecumenato, batismo e confirmação, jejuns, ágapes, eucaristia, ofícios e horas de oração, sepultamento, etc.
Melitão de Sardes (†177) foi bispo de Sardes, na Lídia, um dos grandes luminares da Ásia Menor. Escreveu a Apologia, dirigida ao imperador Marco Aurélio.
Atenágoras (†180) era filósofo em Atenas, Grécia, autor da Súplica pelos Cristãos, apologia oferecida em tom respeitoso ao imperador Marco Aurélio e seu filho Cômodo; escreveu também o tratado sobre A Ressurreição dos mortos, foi grande apologista.
São Teófilo de Antioquia (†após 181) nasceu na Mesopotâmia, converteu-se ao cristianismo já adulto, tornou-se bispo de Antioquia. Apologista, compôs três livros, a Autólico
Santo Ireneu (†202) nasceu na Ásia Menor, foi discípulo de São Policarpo (discípulo de S. João), foi bispo de Lião, na Gália (hoje França). Combateu eficazmente o gnosticismo em sua obra Adversus Haereses (Refutação da Falsa Gnose) e a Demonstração da Preparação Apostólica. Segundo São Gregório de Tours (†594), S. Ireneu morreu mártir. É considerado o “príncipe dos teólogos cristãos”. Salienta nos seus escritos a importância da Tradição oral da Igreja, o primado da Igreja de Roma (fundada por Pedro e Paulo)
Santo Hilário de Poitiers (316-367), doutor da Igreja, foi bispo de Poitiers, combateu o arianismo, foi exilado pelo imperador Constâncio, escreveu a obra Sobre a Santíssima Trindade.
São Clemente de Alexandria (†215). Seu nome é Tito Flávio Clemente, nasceu em Atenas por volta de 150. Viajou pela Itália, Síria, Palestina e fixou-se em Alexandria. Durante a perseguição de Setímio Severo (203), deixou o Egipto, indo para a Ásia Menor, onde morreu em 215. Seu grande trabalho foi tentar a aliança do pensamento grego com a fé cristã. Dizia: “Como a lei formou os hebreus, a filosofia formou os gregos para Cristo”.
Orígenes (184-254) nasceu em Alexandria, Egipto; seu pai Leônidas morreu martirizado em 202. Também desejava o mártirio; escreveu ao pai na prisão: “não vás mudar de idéia por causa de nós”.

Em 203 foi colocado à frente da escola catequética de Alexandria pelo bispo Demétrio. Em 212 esteve em Roma, Grécia e Palestina. A mãe do imperador Alexandre Severo, chamou-o a Antioquia para ouvir suas lições. Morreu em Cesaréia durante a perseguição do imperador Décio.
Tertuliano (†220) de Cartago, norte da África, culto, era advogado em Roma quando em 195 se converteu ao Cristianismo, passando a servir a Igreja de Cartago como catequista. Combateu as heresias do gnosticismo, mas se desentendeu com a Igreja Católica. É autor das frases: “Vede como se amam” e “ O sangue dos mártires era semente de novos cristãos”.
São Cipriano (†258). Cecílio Cipriano nasceu em Cartago, foi bispo e primaz da África Latina. Era casado. Foi perseguido no tempo do imperador Décio, em 250, morreu mártir em 258. Escreveu a bela obra Sobre a unidade da Igreja Católica. Na obra De Lapsis, sobre os que apostataram na perseguição, narra ao vivo o drama sofrido pelos cristãos, a força de uns, o fracasso de outros. Escreveu ainda a obra Sobre a Oração do Senhor, sobre o Pai Nosso.

Eusébio de Cesaréia (260-339), bispo, foi o primeiro historiador da Igreja. Nasceu na Palestina, em Cesaréia, discípulo aí de Orígenes. Escreveu a sua Crônica e a História Eclesiástica, além de A Preparação e as Demonstrações Evangélicas. Foi perseguido por Dioclesiano, imperador romano.
Santo Atanásio (295-373), doutor da Igreja, nasceu em Alexandria, jovem ainda foi viver o monaquismo nos desertos do Egito,onde conheceu o grande Santo Antão(†376), o “pai dos monges”. Tornou-se diácono da Igreja de Alexandria, e junto com o seu Bispo Alexandre, se destacou no Concílio de Nicéia (325) no combate ao arianismo. Tornou-se bispo de Alexandria em 357 e continuou a sua luta árdua contra o arianismo (Ário negava a divindade de Jesus), o que lhe valeu sete anos de exílio. São Gregório Nazianzeno disse dele: “O que foi a cabeleira para Sansão, foi Atanásio para a Igreja.”

Santo Hilário de Poitiers (316-367), doutor da Igreja, nasceu em Poitiers, na Gália (França); em 350 clero e povo o elegiam bispo, apesar de ser casado. Organizou a luta dos bispos gauleses contra o arianismo. Foi exilado pelo imperador Constâncio, na Ásia Menor, voltando para a Gália em 360, fazendo valer as decisões do Concílio de Nicéia. É chamado o “Atanásio do Ocidente”. Escreveu as obras Sobre a Fé, Sobre a Santíssima Trindade.
Santo Efrém (†373), doutor da Igreja – é considerado o maior poeta sírio, chamado de “a cítara do Espírito Santo”. Nasceu em Nísibe, de pais cristãos, por volta de 306, deve ter participado do Concílio de Nicéia (325), segundo a tradição, com o seu bispo Tiago. Foi ordenado diácono em 338 e assim ficou até o fim da vida. Escreveu tratados contra os gnósticos, os arianos e contra o imperador Juliano, o apóstata. Escreveu belos hinos e louvores a Maria.

São Cirilo de Jerusalém (†386), doutor da Igreja, Bispo de Jerusalém, guardião da fé professada pela Igreja no Concílio de Nicéia (325). Autor das Catequeses Mistagógicas, esteve no segundo Concílio Ecumênico, em Constantinopla, em 381.
São Dâmaso (304-384), Papa da Igreja, instruído, de origem espanhola, sucedeu o Papa Libério que o ordenou diácono; obteve do Imperador Graciano o reconhecimento jurisdicional do bispo de Roma. Mandou que S. Jerônimo revesse a versão latina da Bíblia, a Vulgata. Descobriu e ornamentou os túmulos dos mártires nas catacumbas, para a visita dos peregrinos.
São Basílio Magno (329-379), Bispo e doutor da Igreja, nasceu na Capadócia; seus irmãos Gregório de Nissa e Pedro, são santos. Foi íntimo amigo de S. Gregório Nazianzeno; fez-se monge. Em 370 tornou-se bispo de Cesaréia na Palestina, e metropolita da província da Capadócia. Combateu o arianismo e o apolinarismo (Apolinário negava que Jesus tinha uma alma humana). Destacou-se no estudo da Santíssima Trindade (Três Pessoas e uma Essência).
São Gregório Nazianzeno (329-390), doutor da Igreja, nasceu em Naziano, na Capadócia, era filho do bispo local, que o ordenou padre; foi um dos maiores oradores cristãos. Foi grande amigo de São Basílio, que o sagrou bispo. Lutou contra o arianismo. Sua doutrina sobre a Santíssima Trindade o fez ser chamado de “teólogo”, que o Concílio de Calcedônia confirmou em 481.
São Gregório de Nissa (†394) foi bispo de Nissa, e depois de Sebaste, irmão de São Basílio e amigo de São Gregório Nazianzeno. Os três santos brilharam na Capadócia. Foi poeta e místico; teve grande influência no primeiro Concílio de Constantinopla (381) que definiu o dogma da SS. Trindade. Combateu o apolinarismo, macedonismo (Macedônio negava a divindade do Espírito Santo) e arianismo.
São João Crisóstomo (= boca de ouro) (354-407), doutor da Igreja, é o mais conhecido dos Padres da Igreja grega. Nasceu em Antioquia. Tornou-se patriarca de Constantinopla, foi grande pregador. Foi exilado na Armênia por causa da defesa da fé sã. Foi proclamado pelo papa S. Pio X padroeiro dos pregadores.

São Cirilo de Alexandria (†444), Bispo e doutor da Igreja, sobrinho do patriarca de Alexandria, Teófilo, o substituiu na Sé episcopal em 412. Combateu vivamente o Nestorianismo (Néstório negava que em Jesus havia uma só Pessoa e duas naturezas), com o apoio do papa Celestino. Participou do Concílio de Éfeso (431), que condenou as teses de Nestório. É considerado um dos maiores Padres da língua grega, e chamado o “Doutor mariano”.
São João Cassiano (360-465) recebeu formação religiosa em Belém e viveu no Egito. Foi ordenado diácono por S. João Crisóstomo, em Constantinopla, e padre pelo papa Inocêncio, em Roma. Em 415 fundou dois mosteiros em Marselha, um para cada sexo. São Bento recomendou seus escritos.

São Paulino de Nola (†431) nasceu na Gália (França), exerceu importantes cargos civis até ser batizado. Vendeu seus bens, distribuindo o dinheiro aos pobres, e com sua esposa Terásia passou a viver vida eremítica. Foi ordenado padre em 394, em 409 bispo de Nola.
São Pedro Crisólogo (=palavra de ouro) (†450), bispo e doutor da Igreja – foi bispo de Ravena, Itália. Quando Êutiques, patriarca de Constantinopla pediu o seu apoio para a sua heresia (monofisismo -uma só natureza em Cristo), respondeu: “Não podemos discutir coisas da fé, sem o consentimento do Bispo de Roma”. Temos 170 de suas cartas e escritos sobre o Símbolo e o Pai Nosso.

Santo Ambrósio (†397), doutor da Igreja, nasceu em Tréveris, de nobre família romana. Com 31 anos governava em Milão as províncias de Emília e Ligúria. Ainda catecúmeno, foi eleito bispo de Milão, pelo povo, tendo, então recebido o batismo, a ordem e o episcopado. Foi conselheiro de vários imperadores e batizou santo Agostinho, cujas pregações ouvia. Deixou obras admiráveis sobre a fé católica.

São Jerônimo (347-420), “Doutor Bíblico”, nasceu na Dalmácia e educou-se em Roma; é o mais erudito dos Padres da Igreja latina; sabia o grego, latim e hebraico. Viveu alguns anos na Palestina como eremita. Em 379 foi ordenado sacerdote pelo bispo Paulino de Antioquia; foi ouvinte de São Gregório Nazianzeno e amigo de São Gregório de Nissa. De 382 a 385 foi secretário do Papa S. Dâmaso, por cuja ordem fez a revisão da versão latina da Bíblia (Vulgata), em Belém, por 34 anos. Pregava o ideal de santidade entre as mulheres da nobreza romana (Marcela, Paula e Eustochium) e combatia os maus costumes do clero. Na figura de São Jerônimo destacam-se a austeridade, o temperamento forte, o amor a Igreja e à Sé de Pedro.

Santo Epifânio (†403) nasceu na Palestina; muito culto, foi superior de uma comunidade monástica em Eleuterópolis (Judéia) e depois, bispo de Salamina, na ilha de Chipre. Batalhou muito contra as heresias, especialmente o origenismo.

Santo Agostinho (354-430), Bispo e Doutor da Igreja, nasceu em Tagaste, Tunísia, filho de Patrício e S. Mônica. Grande teólogo, filósofo, moralista e apologista. Aprendeu a retórica em Cartago, onde ensinou gramática até os 29 anos de idade, partindo para Roma e Milão onde foi professor de Retórica na corte do Imperador. Alí se converteu ao cristianismo pelas orações e lágrimas, de sua mãe Mônica e pelas pregações de S. Ambrósio, bispo de Milão. Foi batizado por esse bispo em 387. Voltou para a África em veste de penitência onde foi ordenado sacerdote e depois bispo de Hipona aos 42 anos de idade. Foi um dos homens mais importantes para a Igreja. Combateu com grande capacidade as heresias do seu tempo, principalmente o Maniqueísmo, o Donatismo e o Pelagianismo, que desprezava a graça de Deus. Santo Agostinho escreveu muitas obras e exerceu decisiva influência sobre o desenvolvimento cultural do mundo ocidental. É chamado de “Doutor da Graça”.

São Leão Magno (400-461), Papa e Doutor da Igreja, nasceu em Toscana, foi educado em Roma. Foi conselheiro sucessivamente dos papas Celestino I (422-432) e Xisto III (432-440) e foi muito respeitado como teólogo e diplomata. Participou de grandes problemas da Igreja do seu tempo e pôde travar contato pessoal e por cartas com Santo Agostinho, São Cirilo de Alexandria e São João Cassiano, que o descrevia como “ornamento da Igreja e do divino ministério”. Deixou 96 Sermões e 173 Cartas que chegaram até nós. Participou ativamente na elaboração dogmática sobre o grave problema tratado no Concílio de Calcedônia, a condenação da heresia chamada monofisismo. Leão foi o primeiro Papa que recebeu o título de Magno (grande). Em sua atuação no plano político, a História registrou e imortalizou duas intervenções de São Leão, respectivamente junto a Átila, rei dos Hunos, em 452, e junto a Genserico, em 455, bárbaros que queriam destruir Roma.

São Vicente de Lérins (†450). Depois de muitos anos de vida mundana se refugiou no mosteiro de Lérins. Escreveu o seu Commonitorium, “ para descobrir as fraudes e evitar as armadilhas dos hereges”.
São Bento de Núrsia (480-547) nasceu em Núrsia, na Úmbria, Itália; estudou Direito em Roma, quando se consagrou a Deus. Tornou-se superior de várias comunidades monásticas; tendo fundado no monte Cassino a célebre Abadia local. A sua Regra dos Mosteiros tornou-se a principal regra de vida dos mosteiros do ocidente, elogiada pelo papa S. Gregório Magno, usada até hoje. O lema dos seus mosteiros era “ora et labora”. O Papa Pio XII o chamou de Pai da Europa e Paulo VI proclamou-o Patrono da Europa, em 24/10/1964.

São Venâncio Fortunato (530-600) nasceu em Vêneto na Itália, foi para Poitiers (França). Autor de célebres hinos dedicados à Paixão de Cristo e à Virgem Maria, até hoje usados na Igreja.
São Gregório Magno (540-604), Papa e doutor da Igreja. Nasceu em Roma, de família nobre. Ainda muito jovem foi primeiro ministro do governo de Roma. Grande admirador de S. Bento, resolveu transformar suas muitas posses em mosteiros. O papa Pelágio o enviou como núncio apostólico em Constantinopla até o ano 585. Foi feito papa em 590. Foi um dos maiores papas que a Igreja já teve. Bossuet considerava-o “modelo perfeito de como se governa a Igreja”. Promoveu na liturgia o canto “gregoriano”. Profunda influência exerceram os seus escritos: Vida de São Bento e Regra Pastoral, usado ainda hoje.

São Máximo, o Confessor (580-662) nasceu em Constantinopla, foi secretário do imperador Heráclio, depois foi para o mosteiro de Crisópolis. Lutou contra o monofisismo e monotelismo, sendo preso, exilado e martirizado por isso. Obteve a condenação do monotelismo no Concílio de Latrão, em 649.
Santo Ildefonso de Sevilha (†636), doutor da Igreja. Considerado o último Padre do ocidente. Bispo de Sevilha, Espanha desde 601. Em 636 dirigiu o IV Sínodo de Toledo. Exerceu notável influência na Idade Média com os seus escritos exegéticos, dogmáticos, ascéticos e litúrgicos.

São João Damasceno (675-749), Bispo e Doutor da Igreja, é considerado o último dos representantes dos Padres gregos. É grande a sua obra literária: poesia, liturgia, filosofia e apologética. Filho de um alto funcionário do califa de Damasco, foi companheiro do príncipe Yazid que, mais tarde o promoveu ao mesmo encargo do pai, ministro das finanças. A um deteminado tempo deixou a corte do califa e retirou-se para o mosteiro de São Sabas, perto de Jerusalém. Tornou-se o pregador titular da basílica do Santo Sepulcro. Enfrentou com muita coragem a heresia dos iconoclastas que condenavam o culto das imagens. Ficaram famosos os seus Três Discursos a Favor das Imagens Sagradas.

Historia da Igreja VI

6. Roma e o Cristianismo – As primeiras perseguições
Melitão, bispo de Sardes, cidade da Ásia Menor, escreveu uma carta ao imperador Marco Aurélio defendendo os cristãos perseguidos. Nesta carta ele fala da providencial coincidência entre o nascimento do Império e o aparecimento do Cristianismo. Jesus nasceu quando Augusto era imperador, e pregou no reinado de Tibério. A rápida expansão do Cristianismo deveu-se principalmente à unificação da bacia mediterrânea sob o poderio romano e às facilidades proporcionadas pelas estradas e rotas marítimas que permitiam a rápida circulação de pessoas e ideias.
Mas quando foi que o Império começou a se dar conta da existência do Cristianismo?
O documento oficial mais antigo falando dos cristãos é do ano 112: uma carta enviada a Trajano pelo procônsul da Bitínia, Plínio o Jovem.
A opinião pública confundia os judeus com os cristãos. Geralmente ambos os grupos eram vítimas das mesmas acusações e maledicências. Mas em Roma a diferença foi percebida bem cedo. Em 49, Cláudio "expulsa de Roma os judeus que se agitavam por instigação de Crestos [Cristo?]" (Suetónio).
Nero começou a governar com a idade de 17 anos. Dirigiu o Imperium de 54 a 68. Mandou matar o irmão, a mãe e seu mestre, Séneca (os dois últimos sob influência da sua amante, Pompeia Sabina). Em 62 divorciou-se da mulher, Octávia, a qual fez exilar em Pandatária. Tantos crimes provocaram a indignação popular.
Foi na noite de 18 (ou 19?) de Julho de 64 que as trombetas das sentinelas começaram a ser ouvidas pelos quatro cantos de Roma. O fogo espalhava-se rapidamente. Depois de cento e cinquenta horas, quatro dos catorze bairros da Cidade tinham sido completamente devorados pelas chamas, enquanto de sete só sobravam as paredes das edificações ou escombros inabitáveis.
Sobre as causas da calamidade circularam vários rumores. Alguns pensaram que tinha sido apenas um acidente. Mas atribuir ao acaso tamanha destruição não parecia uma hipótese muito plausível. Precisava-se de um culpado. E logo o seu nome começou a correr de boca em boca.
Seria o próprio Nero o responsável? Sabia-se que ele desejava demolir as velhas construções para edificar uma nova Roma. Talvez fosse um castigo dos deuses por causa dos crimes hediondos do imperador. O historiador Suetónio fala de um boato segundo o qual Nero teria permanecido em uma torre durante o incêndio, com roupas de teatro e uma lira, admirando o terrível espectáculo e entoando um poema de sua autoria sobre a conquista de Tróia e o fogo nela ateado pelos guerreiros de Agamenon.
Nero logo teve de escolher um bode expiatório. Através de torturas e falsas testemunhas, obteve as "provas" para acusar os cristãos. As prisões ficaram lotadas a ponto de Tácito se referir aos encarcerados como uma "grande multidão". Sob acusação de "inimigos do género humano", os cristãos foram perseguidos.
Tertuliano fala de um instrumento jurídico instituído por Nero para legalizar a perseguição, o Institutum Neronianum, que afirmava a ilicitude do cristianismo ("non licet esse Christianos", «não é lícito ser cristão».). Mas os historiadores não são unânimes em reconhecer isto como fato.
Na verdade, não era apenas os cristãos que eram trucidados, degolados e crucificados no circo de Nero (que ficava localizado onde hoje está a Basílica de São Pedro). Organizaram-se verdadeiras caçadas nos jardins do Imperador, com fiéis fantasiados de animais. Foram encenadas as mais escabrosas cenas, copiando a mitologia pagã, onde os "actores", cristãos, eram humilhados e ultrajados de mil maneiras e com sadismo indescritível. Durante a noite, pelas alamedas, cristãos cobertos de pez e resina ardiam em chamas, queimados vivos, iluminando o caminho para a passagem da carruagem de Nero.
Pedro, numa de suas epístolas, alude a esses terríveis sofrimentos. Mais tarde, quando João escrever o Apocalipse, a sua lembrança ainda será muito viva.
Nada mudou com Domiciano (81-96), que se autoproclamou "Dominus et Deus". Quando o século I termina, a fé cristã já começa a conquistar as classes mais altas, chegando até o palácio do Imperador. Flávio Clemente, Flávia Domitila, parentes de Domiciano, e Acílio Glábrio, um dos cônsules de 91, eram já cristãos. Para satisfazer a alegria das elites pagãs, o Imperador massacrou os fiéis, tomando seus bens e executando-os sob a acusação de ateísmo. Na Ásia a perseguição foi bem violenta.
Trajano (98-117), mais tolerante, responde a Plínio o Jovem, em uma carta dizendo que os cristãos não deviam ser procurados e que as denúncias anónimas deviam ser ignoradas. O Rescrito de Trajano, como é conhecido este documento, estabeleceu jurisprudência.

Historia da Igreja V

5. O fim de Jerusalém
Cansado da brutalidade dos procuradores Albino (62-64) e Géssio Floro (64-66), e incitado pelo movimento zelota, o povo judeu revoltou-se. Em Cesaréia e Jerusalém houve grande agitação social. A fortaleza Antónia e o palácio de Herodes foram consumidos pelas chamas. As suas guarnições foram massacradas. Ataques contra guarnições romanas rebentavam em toda a Palestina.
Durante o inverno de 66-67, o legado da Síria levou doze legiões pela costa mediterrânea e conseguiu chegar aos muros de Jerusalém, mas foi derrotado pelos guerrilheiros judeus. A vitória exaltou os ânimos dos rebeldes. Chegaram a ser cunhadas moedas de prata com a data do "primeiro ano da liberdade" de Israel.
Roma reagiu com força. Em 67 Nero enviou o general Vespasiano que com sessenta mil soldados devastou a Galileia. Mas ao chegar à região montanhosa do país sofreu várias derrotas, algumas bem graves.
Na Páscoa do ano 70, Vespasiano, sucessor de Nero (depois de alguma confusão), enviou o seu filho Tito para Jerusalém, com todas as forças necessárias. A Cidade Santa foi cercada.
Depois de cinco meses de horror o cerco termina com a vitória dos romanos. Jerusalém é reduzida a ruínas, o Templo incendiado e muitos cadáveres ficaram apodrecendo pelas ruas. A resistência judaica ficou reduzida a grupos insignificantes.
O último reduto situou-se em Massada. No ano 73, Flávio, legado da Judeia, triunfa sobre os revoltosos sicários chefiados por Eleazar, os quais, para evitarem uma humilhante rendição, preferem matar-se uns aos outros.
Tais fatos só contribuíram para aumentar ainda mais a tensão entre judeus e cristãos. O historiador Tácito fala de um comentário feito por Tito, evocando "a luta de uma destas seitas contra a outra [judeus e cristãos], apesar da sua origem comum".
Por volta do ano 93, o historiador judeu Flávio Josefo, no seu livro Antiguidades Judaicas, descreve detalhadamente o cerco e a destruição da cidade santa.
No começo do século II o imperador Adriano (117-138) ordenou a reedificação de Jerusalém. Mas, ao mesmo tempo, mandou encher a cidade de ídolos. As sobras da resistência de Israel ficaram inflamadas. Um pseudo-messias chamado Bar Kókeba, e um certo rabi Akiba, incentivam a revolução.
Mais três anos de horror se sucederam. Os fanáticos combateram em duas frentes: contra os romanos e contra os cristãos. Roma esmagou impiedosamente os agitadores. Bar Kókeba foi degolado e os sobreviventes dispersos. De futuro, os judeus só poderão aproximar-se novamente de Jerusalém apenas de quatro em quatro anos, para poderem chorar e lamentar a sua desgraça.

Historia da Igreja IV

4. As primeiras comunidades cristãs
O que mais impressiona nas primeiras comunidades cristãs é o fervor e a coragem dos cristãos. Diante das autoridades e dos adversos líderes religiosos do seu tempo, os fiéis não temem confessar que Jesus é o Messias. A presença do Espírito Santo é muito viva. Cada Igreja Local tinha seus ministros, apóstolos, profetas, doutores... Todo o fiel recebia de Deus carismas especiais, que devia colocar à disposição da comunidade (dom de línguas, sabedoria, cura, ensino...).
A actuação feminina era expressiva, mas não havia confusão entre o papel do homem e o papel da mulher (a sociedade romana era muito machista e tratava a mulher como se fosse propriedade do marido; as crianças também eram desprezadas, podendo ser rejeitadas ou abandonadas à própria sorte pelo pai — tudo isto, porém, muda entre os cristãos). Em Cristo não há diferença de dignidade entre grego e judeu, homem e mulher, escravo (a sociedade romana era esclavagista) e livre. Todos se reuniam para celebrar a Eucaristia (ou Fracção do Pão) especialmente no domingo (que substituiu o sábado como o sétimo dia dos cristãos, por causa da ressurreição do Senhor), oravam em comum, partilhavam os seus bens, ajudavam os pobres. O rito de iniciação cristã era o baptismo, no qual os efeitos da morte redentora de Cristo eram aplicados sobre o crente. Havia ainda a imposição de mãos, ou Crisma, através da qual o fiel confirmava o seu compromisso e assumia uma missão na comunidade, e a unção dos enfermos, que servia para curar e confortar os doentes.
Uma fonte importante sobre a vida das comunidades cristãs do final do séc. I e início do séc. II é a Didaqué, ou Instrução dos Doze Apóstolos, uma espécie de catecismo primitivo. A primeira parte da Didaqué apresenta os dois caminhos que o homem pode escolher: o da vida ou o da morte. Seguem-se orientações para a conduta dos fiéis e exortações. Na segunda parte da Didaqué há uma descrição da vida sacramental e da oração. O baptismo é feito em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e, quando a imersão não é possível, a água pode ser simplesmente derramada três vezes sobre a cabeça de quem vai receber o sacramento. Os crentes devem jejuar duas vezes na semana e rezar o Pai Nosso três vezes por dia. A celebração dominical (Missa) é o sacrifício verdadeiro que cumpre a profecia de Malaquias 1:10s. Antes de se realizar a fracção do pão os fiéis fazem uma espécie de acto penitencial (exomologese). A Didaqué também fala de apóstolos, profetas inspirados pelo Espírito Santo (os quais chama de sumo sacerdotes) e mestres que percorrem as Igrejas. Bispos e diáconos são escolhidos pelos fiéis, com a mesma dignidade dos profetas e dos mestres. Por último, adverte contra os "falsos profetas e corruptos", e contra o Anticristo que virá quando o fim estiver próximo. Aqueles que perseverarem na fé durante a grande tribulação serão salvos. Depois que o céus se abrirem, após o soar da trombeta e a ressurreição dos mortos, "o mundo verá o Senhor vindo sobre as nuvens do céu".
Sobre a penitência, já lemos no Evangelho de João (20:21-23) que Cristo conferiu aos Apóstolos o poder de perdoar pecados. Paulo, em sua primeira carta aos Coríntios, condena um caso de incesto e excomunga os responsáveis, esperando que com isto eles se arrependam e retornem para o Senhor. Na epístola de Tiago há uma exortação para a confissão dos pecados (5:16-18). Há casos, porém, de faltas graves para as quais se hesita em reconhecer a possibilidade de remissão (Hebreus 10:26ss; ver também a distinção que o Apóstolo João faz entre pecados que levam à morte e pecados que não levam à morte, 1João 5:16). Quem renega a fé não encontrará misericórdia para seu crime, segundo o autor da carta aos Hebreus.
Os primeiros cristãos eram geralmente gente simples, das camadas sociais mais baixas. Exteriormente não se distinguiam das outras pessoas do seu tempo, mas viviam de modo honesto e digno. Procuravam ser obedientes às autoridades e oravam pelos governantes.
À frente de cada comunidade havia epíscopos, ou então um colégio de presbíteros. Havia também diáconos, que cuidavam da administração e da distribuição dos bens entre os necessitados. Tanto os epíscopos como os presbíteros e os diáconos eram ordenados através da imposição de mãos. Esta estrutura ministerial, ainda não muito precisa, deu origem à hierarquia da Igreja tal como a conhecemos hoje.
Com Santo Inácio de Antioquia as coisas ficarão mais claras: "Que todos, assim como reverenciam Cristo, reverenciem os diáconos, o bispo, que é a imagem do Pai, e os presbíteros, que são o Senado de Deus, a Assembleia dos Apóstolos". No início do século II, este regime se imporá naturalmente entre as igrejas da Ásia.
O que não se pode negar é que, desde os seus primórdios, a Igreja possui uma constituição hierárquica, formada pelos Apóstolos e por Pedro, e que esta constituição foi transmitida sempre e ininterruptamente através do sacramento da Ordem. Os apóstolos fundaram comunidades e ordenaram pessoas para presidi-las. Estas, por sua vez, ordenaram outras como sucessoras, e o processo prosseguiu em uma cadeia contínua que permite ligar cada bispo, cada padre, cada diácono da Igreja de hoje aos apóstolos e, dos Apóstolos, ao próprio Jesus Cristo.
De modo particular, o bispo de Roma é o sucessor do Apóstolo Pedro e, portanto, responsável por garantir a unidade e a integridade da fé da Igreja.
Outra característica relevante dos primeiros cristãos era a ansiedade pelo retorno do Senhor, a Parusia. Pelas cartas de Paulo vemos que a volta iminente de Jesus era crença comum. Nas assembleias litúrgicas ouvia-se frequentemente a exclamação cheia de esperança: "Maranatha! Vem Senhor Jesus!" Com o tempo percebeu-se que a vinda de Jesus não era tão iminente.
O cristianismo se aproveitou da imensa rede de estradas que interligava o Império. Desenvolveu-se principalmente no meio urbano. De boca em boca, através de escravos, mercadores, viajantes, judeus helenizados, artesãos, a Boa-Nova ia chegando aos lugares mais distantes. O Império de Roma tornou-se, logo, a "Pátria do Cristianismo".

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

História da Igreja III

3. Nasce a Igreja

Os Evangelhos mostram a Igreja como um barco, no qual Jesus está presente, embora em alguns momentos pareça estar dormindo (Mt 8,23-27). O mar que este barco atravessa é a História, às vezes calma, outras vezes turbulenta e ameaçadora. Há quase dois mil anos que o barco saiu do porto de abrigo. Não sabemos quando chegará ao seu destino, mas temos certeza de que Jesus nunca o abandonará.
A Igreja é um projecto que nasceu do coração do Pai, prefigurada desde o início dos tempos, preparada na Antiga Aliança com Israel, instituída por Cristo Jesus. A Igreja é o Reino de Deus misteriosamente presente no mundo. Ela se inicia já com a pregação de Jesus. Foi dotada pelo Senhor de uma estrutura que permanecerá até o fim dos tempos. Edificada sobre Pedro e os demais Apóstolos, é dirigida por seus legítimos sucessores.

A Igreja começa e cresce do sangue e da água que saíram do lado aberto do Crucificado. Nela se conserva a comunhão eucarística, o dom da salvação oferecido por Jesus em nosso favor.
A Igreja é indefectivelmente santa, sem mancha e sem ruga, porque o próprio Deus habita nela , santificando-a por Sua presença. O pecado dos fiéis não lhe pertence. Só em sentido derivado e indirecto se pode falar de "Igreja pecadora".
No dia de Pentecostes, "a Igreja se manifestou publicamente diante da multidão e começou a difusão do Evangelho com a pregação" (Ad Gentes, n. 4).
O Pentecostes aconteceu por volta do ano 30. Estavam todos reunidos: os Apóstolos, Maria, familiares de Jesus, algumas mulheres. Um ruído de ventania desce do céu. Línguas como de fogo surgiram e se dividiram entre os presentes. Todos ficaram cheios do Espírito de Deus e começaram a falar em outras línguas.
Esta assembleia inicial, esta kahal, ekklesia, igreja, é o princípio. Depois do prodígio das línguas, Pedro dirigiu-se à multidão reunida na praça e fez uma memorável pregação. Muitos se converteram, especialmente judeus vindos da Diáspora. Estes levaram a Boa Nova aos seus locais de origem, o que provocou o surgimento, bem cedo, de comunidades cristãs em Damasco, Antioquia, Alexandria e mesmo em Roma. Alguns helenistas, no entanto, permaneceram em Jerusalém. Para cuidar de suas necessidades materiais, os Apóstolos escolheram sete diáconos.
Filipe, um dos sete, evangelizou em Samaria (foi lá que Simão, o Mago, ofereceu dinheiro aos apóstolos Pedro e João em troca do Espírito Santo, donde o termo simonia - tráfico de coisas sagradas e de bens espirituais) e anunciou à Boa Nova a um etíope, funcionário da casa real de Candace.
Estevão (identificado como amigo e colega de estudos de Paulo) era o diácono que mais se destacava. Por causa sua pregação incisiva, é detido pelas autoridades judaicas, julgado e apedrejado como blasfemo. Torna-se o primeiro mártir da História da Igreja. Enquanto é assassinado, perdoa os seus perseguidores e entrega, confiante, a sua vida nas mãos de Jesus.
O manto de Estevão foi deixado aos pés de um jovem admirador do ideal farisaico chamado Saulo. (Afinal, seu amigo!)

História da Igreja II

2. O Messias

Nazaré era uma pequena povoação, uma aldeia entre tantas outras da região da Galileia. Quem passasse por ali veria um ajuntamento desordenado de casas numa encosta rochosa, com uma fonte nas proximidades, cuja água havia atraído seus primeiros habitantes.
Nazaré não tinha boa fama. Ainda hoje existe um ditado na Palestina que diz: "A quem Deus quer castigar, com uma nazarena o faz casar". Aliás, Natanael, ao saber que Jesus era de lá, perguntou a Filipe: "De Nazaré pode vir algo bom?".
Neste lugar desprezado por todos vivia uma jovem, desposada por um carpinteiro chamado José. Embora provavelmente não chamasse a atenção, a não ser por sua profunda piedade, fé e pureza de coração, tinha sido ela a escolhida, a eleita de Deus para ser a Mãe do Messias. O Salvador esperado por Israel e profetizado nas Escrituras, que libertaria o povo da opressão e implantaria um Reino maior que o de David.
Maria, a cheia de graça, soube por um anjo qual era a decisão de Deus... e disse sim.
Adoptado por José, Jesus nasceu em Belém, na Judeia, talvez entre os anos 6 e 7 antes da nossa era (outros situam o seu nascimento entre 4 e 5 a.C. - há controvérsias; o monge sírio Dionísio, o Pequeno, no séc. VI, cometeu um erro na hora de fixar a divisão em a.C. e d.C., adiantando a data do nascimento de Jesus em alguns anos). Durante trinta anos viveu "escondido". Ajudava o pai e a mãe, cuidava de tarefas domésticas, estudava a Torá, aprendia o ofício de carpinteiro, "crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e diante dos homens" (Lc 2,52).
Um dia, arrumou suas ferramentas, despediu-se de sua mãe, e partiu rumo ao rio Jordão, onde seu primo, João Baptista, pregava e baptizava.
Depois de ser baptizado e de passar algum tempo no deserto, Jesus deu início ao seu ministério público. Escolheu doze Apóstolos — os fundamentos de sua Igreja, entre os quais se destacam Pedro, Tiago e João. Atravessou a Palestina várias vezes realizando milagres e pregando o Reino de Deus. Boa parte dos seus ensinamentos foram proferidos na Galileia: a oração do Pai Nosso, as bem-aventuranças, o anúncio da paixão... Sua visão da Lei e seu modo de agir incomodam os responsáveis pela religião oficial que começam a tramar meios para eliminá-lo. O modo como se relaciona com Deus - seu Pai, e a afirmação velada de sua divindade, eram intoleráveis para os fariseus e os escribas.
No final do ano 29, Jesus desce lentamente para Jerusalém. Sabe que sua hora está próxima. A festa do domingo de Ramos é logo sucedida pela prisão, pelo processo diante de Pôncio Pilatos, procurador romano, e pela condenação à morte na cruz.
Provavelmente no dia 14 de Nisan do ano 30, ou 7 de abril no nosso calendário, uma sexta-feira, Jesus de Nazaré morreu crucificado juntamente com dois ladrões. No madeiro foi cravada uma placa com a inscrição: «Jesus de Nazaré, rei dos Judeus», escrita em hebraico, grego e latim. Ao pé da cruz, estavam um grupo de mulheres, incluindo sua mãe, e um discípulo. Depois do suplício, o corpo de Jesus é colocado por alguns seguidores em um sepulcro ali perto. Tudo parecia terminado.
É fácil aceitar que Jesus morreu. Mas sua ressurreição é algo que surpreende e escandaliza, que parece ferir o bom senso e a razão. No entanto, é exactamente isto que os Apóstolos testemunharam três dias depois do "desastre" em Jerusalém: Jesus ressuscitou, ele vive!
A ressurreição é o fulcro, a base de toda a fé cristã: "...se Cristo não ressuscitou, ilusória é a vossa fé..." (1Cor 15,17).
Jesus apareceu várias vezes aos Apóstolos. Deixou-lhes instruções, preparou-os mais um pouco para o que viria a seguir. Quarenta dias depois da Páscoa, "subiu aos Céus", não sem antes prometer outro Paráclito para conduzir a sua Igreja.

Historia da Igreja I

1. O terreno onde a semente foi plantada
Há quase dois mil anos, o mundo mediterrânico era controlado por Roma. O Grande Império estendia-se da Síria até Portugal, das Ilhas Britânicas até o Egipto. Fundado pelo génio de Octávio Augusto, que soube concentrar em suas mãos o poder sem destruir as aparências da República, o Império vivia, no início da nossa era, um período de paz e prosperidade (Pax Romana).
O helenismo pela via do estoicismo e do platonismo e dos costumes influenciava o pensamento do mundo mediterrânico e estimulava o gosto pelas coisas espirituais. Uma grande efervescência religiosa atingia todas as camadas da sociedade. O panteão romano, retocado pelo Olimpo grego, conservava o seu prestígio e contava com inúmeros fiéis devotos. Mas existiam outras correntes em desenvolvimento. Pregadores vários anunciavam os seus deuses em cada canto do Império. Vindos do Egipto, através de Alexandria, chegavam os mistérios de Ísis e de Serápis. Os fenícios adoravam os seus baalins. Em Roma, havia o culto sensual da deusa Cibele, mãe de Pessinonte. O orfismo afirmava a existência de mediadores entre Deus e os homens; para os pitagóricos, um Logos. As almas mais inquietas e sedentas de eternidade voltavam-se para os mistérios de Mitra, o deus-sol dos arianos, cujo culto se fortalecia com a astrolatria caldeia. Uma enorme diversidade de sincretismos e superstições pululava por toda a parte.
Trazido do Oriente, desenvolvido pelos sucessores de Alexandre Magno, o culto ao soberano implantou-se no Império. Quando morria um imperador, logo surgia um culto oficial à sua divindade. Nas províncias orientais, porém, o imperador era adorado ainda em vida.
No meio dessa babel de crenças, um povo fazia questão de manter-se fiel a um só Deus, fugindo de toda contaminação pagã. Na Diáspora ou na Palestina, o pequeno povo de Israel jamais havia esquecido a fé dos antepassados, Abraão, Isaac e Jacob, e de como Yahweh os tinha libertado da escravidão no Egipto. Tinha consciência do seu status superior, de ser uma raça escolhida e predestinada por Deus, herdeira das promessas divinas.
Entre Yahweh e o seu povo havia um laço, a Torá, a Lei que Moisés recebera no monte Sinai e que tinha de ser observada zelosamente. A Lei era uma colectânea de preceitos éticos e religiosos fixados em um conjunto de cinco livros sagrados, o Pentateuco. Ao lado do Pentateuco existiam outros livros, de cunho histórico, profético, poético, salmos... A sua colecção formava as Escrituras Sagradas do judaísmo.
Na época de Jesus ainda não havia um cânone fixo das Escrituras. Só depois, no final do século III, surgirá uma definição mais rigorosa. Ao lado dos livros, havia entre os judeus uma tradição oral, transmitida de pai para filho. O sinédrio, tendo a frente o Sumo Sacerdote, e os escribas, era o responsável pela guarda da Lei. Jerusalém, a cidade sagrada, e seu templo, eram o centro da religiosidade dos judeus.
Fora da Palestina, o judaísmo alexandrino começava a assimilar elementos do platonismo e do estoicismo. Fílon de Alexandria (13 a.C. a 54 d.C.) construiu um sofisticado sistema teológico e filosófico que integrava as Escrituras com certas correntes do pensamento grego. Tal movimento influenciava profundamente as comunidades judias da Diáspora e preparava o caminho para o desenvolvimento da teologia cristã.
Na Terra Santa, qualquer tentativa de assimilação com o helenismo era fortemente repelida. Antíoco Epífanes teve a ousadia de colocar um Júpiter olímpico no templo de Jerusalém e por isto enfrentou a ira dos Macabeus. Uma verdadeira guerra santa. Mesmo quando Roma reduziu Israel à condição de simples vassalo, o povo de Deus se apegou mais ainda à fé de seus pais e se uniu aos fariseus, sucessores dos piedosos (hasidim) da época dos Macabeus.
Os fariseus tinham uma espiritualidade centrada na meditação e no cumprimento da Torá. Para eles o pai judeu que ensinasse grego ao seu filho era maldito. Impunham uma rígida observância do Sábado. Cuidavam para que os menores mandamentos fossem sempre respeitados. Acreditavam na imortalidade da alma, na ressurreição, na existência de anjos, contrariando os ensinamentos dos saduceus, os quais só reconheciam o Pentateuco.
Os zelotas, rebeldes que combatiam a dominação romana pela luta armada, encarnavam o nacionalismo judeu em sua forma mais fanática e intransigente. Os essénios, segundo Flávio Josefo, estabeleciam-se em várias cidades e eram numerosos. A comunidade essénica de Qumran diferenciava-se pelo seu estilo de vida cenobítico. Os Manuscritos do Mar Morto, encontrados recentemente, nos deram mais informações sobre este grupo em particular.
"Quando, porém, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei..." (Gal 4,4).

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A Iniciação Cristã

50' que valem bem uma pausa serena no dia. Falam dos Sacramentos da Iniciação Cristã. O que é o Sigilo de Deus? o que nos torna conformes a Cristo? Quem confirma o quê e a quem? AInda hoje participamos o Sacrifício de Cristo? O que é o pãos dos peregrinos?
Não importa que saibas responder a tudo. Passa por lá, e ouve...
http://tv1.rtp.pt/multimedia/progAudio.php?prog=1035&clip_wma=73102

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Décimo encontro: Deus fala pela Sagrada Escritura

1. A BÍBLIA: UM LIVRO COM HISTÓRIAS ANTIGAS OU COM MENSAGEM ACTUAL
A Bíblia é o livro mais conhecido do mundo. Católicos, protestantes e ortodoxos encontram aqui a Palavra de Deus normativa da sua fé. Muitas pessoas, mesmo não crentes, apreciam a riqueza literárias e moral deste livro sagrado.
No entanto, muitos conservam a Bíblia apenas na estante, sempre nova devido á falta de uso. Compraram-na, talvez ainda tentassem lê-la, mas depois desanimaram devido à linguagem difícil e estranha.
Ao longo das catequeses que temos vindo a fazer procurámos contactar de perto com este livro maravilhoso.
Que frutos colhemos deste contacto? No teu meio a Bíblia tem significado e interesse para os católicos? Em que o notas? Qual a razão?
Certamente não é um livro muito fácil. Narra o desígnio misterioso de Deus de salvar os homens e nem sempre a linguagem comum é adequada para exprimir estas realidades da fé. Daí o emprego frequente de imagens e símbolos por vezes estranhos à nossa mentalidade.
Por outro lado, narra acontecimentos da história da Salvação decorridos em épocas e culturas muito diferentes das nossas. No tempo de Abraão, de Moisés ou de Isaías a maneira de pensar, de viver e de se exprimir era muito diversa da nossa. Assim torna-se necessária uma preparação própria para entender a Sagrada escritura.
Os comentários ou explicações que temos feito nestes encontros contribuíram para uma melhor compreensão da Bíblia? Que aspectos novos descobrimos?
Neste momento conhecemos já bastantes acontecimentos e personagens da Sagrada escritura. É, portanto, a altura própria para procurarmos alcançar uma visão de conjunto da Bíblia de modo a compreendermos melhor os seus géneros literários e a podermos situar no contexto próprio cada um dos seus livros.
Neste sentido, vamos dedicar os próximos encontros a um estudo mais profundo da Bíblia. Para podermos acompanhar melhor esta reflexão devemos ler em casa a introdução que vem no início da Bíblia e trazê-la sempre connosco para os encontros.

2. A BÍBLIA MENSAGEM DE DEUS AOS HOMENS

2.1. A Bíblia narra a Aliança entre Deus e os homens

A Bíblia conta a história da Aliança entre Deus e os homens. A aliança é a realidade de fundo de toda a Bíblia que se desenvolve e aperfeiçoa continuamente até Jesus Cristo. Assim a Bíblia apresenta-se em duas grandes partes: A antiga Aliança e a nova Aliança (também se diz «Testamento» para indicar que é a disposição definitiva de Deus a respeito dos homens).
A Bíblia narra a iniciativa ou disposição da parte de Deus de estabelecer com os homens um relacionamento de amizade mútua. É o que significa Aliança ou Testamento. Tendo criado o homem para viver em comunhão com Ele, Deus dotou-o de liberdade permitindo-lhe aceitar ou recusar este destino. Quando o homem, pelo pecado, se afasta da comunhão com Deus. Este não o abandona mas vai ao seu encontro chamando-o de novo à amizade com Ele. É a história da Aliança.
Ao longo das catequeses reflectimos já nalgumas etapas da Aliança: com Abraão a que, Deus promete a bênção, um país e uma numerosa descendência; com Moisés a quem Deus chama a libertar o povo do Egipto estabelecendo depois, por seu intermédio, um tratado de protecção a Israel, indicando ao povo um estilo de vida (a lei da Aliança); com os profetas interiorizando a Aliança e prometendo uma nova Aliança. Finalmente através de Jesus Cristo que realizou a promessa da nova e eterna Aliança.
Podemos acompanhar este desenvolvimento da Aliança ao longo da Bíblia consultando algumas passagens significativas:

Abraão (Gn 15:1-6; 18)
Moisés (Ex 19:1-8)
Jeremias (Jer 31:31-34)
Jesus Cristo (Mt 26:26-29)

2.2 A Palavra de Deus em palavra humana
A palavra Bíblia significa «livros». Realmente, a Bíblia é uma colecção de livros, escritos em épocas diferentes e em estilos diversos. Ao todo 73 livros (46 do Antigo e 27 do Novo Testamento).
Já abordámos algumas das épocas da história da Salvação narrada nos diferentes livros da Bíblia: Patriarcas; Êxodo; posse da Terra Prometida; Juízes; Reis; desterro; regresso a Jerusalém e época do Judaísmo.
Tendo em conta os diferentes géneros literários, podemos agrupar os livros do Antigo Testamento em três secções: Históricos; Sapienciais ou Didácticos e Proféticos.
Vamos analisar cada uma destas secções:

A – Livros históricos
Apresentam uma visão teológica da história, discernindo o projecto de Salvação de Deus na história de Israel. Na fidelidade ou no pecado do povo, Deus intervém encaminhando a história para Salvação (Ler Juízes 2:11-19).
Esta secção engloba o Pentateuco (os primeiros cinco livros da Bíblia atribuídos a Moisés) e outros dezasseis livros que narram a história do povo israelita.
O Pentateuco ou livro da «Lei» (em aramaico TORAH) é o mais importante desta secção. Frequentemente, aparece o convite a meditá-lo: «Quanto amo Senhor a vossa Lei, nela medito durante todo o dia». (Salmo 119:97). «Nela meditarás quer estando sentado em casa, quer andando pelos caminhos, quando te deitas e quando te levantas» (Dt 6:7).

B – Livros Sapienciais
São sete livros que exprimem a sabedoria do povo que se conduz pelos caminhos de Deus. Estão redigidos em forma de provérbios, hinos, cânticos e orações.
O livro mais conhecido desta secção é o dos Salmos que contém 150 orações de uma grande riqueza espiritual. Manifestam uma profunda experiência de fé que se mantém actual e paradigmática em todos os tempos. Apresentam-se em forma de louvor (Sl 103; ou de arrependimento (Sl 50); de súplica (Sl 86); ou de acção de graças (Sl 100).

C – Livros Proféticos
São compostos por escritos dos profetas. Estes são conhecidos por profetas maiores – aqueles cujos escritos são mais extensos: Isáias, Jeremias, Ezequiel e Daniel – e profetas menores, cujos escritos são menos extensos, em número de catorze.

3. PALAVRA DE DEUS VIVA E ACTUAL

Os livros do Antigo Testamento foram escritos pouco ao longo de 10 séculos aproximadamente. Inicialmente, a história e as leis do Povo de Israel passavam de boca em boca – era a transmissão ou tradição oral. No reino de Salomão, com o desenvolvimento da literatura, começaram a redigir-se as tradições orais. Assim se compreende a grande variedade de géneros literários existentes na Bíblia desde: história; leis; crónicas; poesia; cânticos; provérbios; e até novelas com significado teológico (por exemplo a vida de Jonas)
No entanto, a Bíblia no Antigo Testamento não narra apenas a história passada do povo israelita. Por detrás dos acontecimentos históricos apresenta-nos a interpretação do desígnio de Deus. É a história da Salvação que se realiza na história do povo eleito. A Bíblia apresenta-nos realmente a Palavra de Deus revestida em géneros literários diferentes, em palavra humana de cada época.
Assim o conhecimento do contexto histórico é importante para compreender o sentido de cada livro. Mas não é suficiente. A partir do contexto histórico devemos depois aplicar ao presente ara descobrir a Palavra de Deus sempre viva e actual.
A. Marto - M. Pelino

Nono encontro: Deus manifesta-se através de sinais

1. DEUS REVELADO E ESCONDIDO

No encontro anterior verificámos a humildade e discrição do nascimento de Jesus. As pessoas importantes do seu país não tomam conhecimento do facto. São os pobres, como os pastores, que O vão visitar.
Ainda hoje Jesus é ignorado por muita gente. Mesmo na celebração do Seu nascimento, pelo Natal, Jesus parece ausente ou então motivo de segunda importância para as festas sociais e para as prendas.
Este facto coloca-nos uma questão: Deus mostra-se às pessoas, dá-se a conhecer, ou permanece oculto? Manifesta-se de modo visível ou é um Deus escondido? Como se apresenta?
A nossa época valoriza muito os meios «audiovisuais» – o que se vê, o que se apregoa. Os conhecimentos baseiam-se no que se observa e no que se experimenta. Ora Deus é invisível e transcendente.
Haverá sinais visíveis que O manifestam? Haverá «pegadas» da presença de Deus?
Neste encontro vamos reflectir na resposta da Sagrada Escritura, sobretudo do Novo testamento, a esta questão. Tendo em conta os sinais de Deus referidos na Sagrada escritura podemos descobrir também o modo como Deus se manifesta hoje s nossos olhos.

2. JESUS MANIFESTA-SE ATRAVÉS DE SINAIS

2.1. Jesus manifesta-se de modo discreto

O tempo da epifania, que celebramos logo após o Natal, ajuda-nos a esclarecer esta questão. «Epifania» quer dizer «manifestação». Jesus realmente não quis permanecer ignorado: deu-se a conhecer. Tendo nascido pobre e escondido Ele manifestou-se: - aos pastores, através dos anjos que lhes deram um sinal de identificação (Lc 2, 12). - aos magos, através de um sinal no Universo (um astro que lhes anunciou o nascimento de Jesus). - aos Judeus, no Baptismo e na vida pública, mostrando que vinha realizar as profecias. - aos discípulos, em Cana de Galileia e outras ocasiões, realizando sinais que O acreditam como Messias.
Concluímos pois: Jesus nasce pobre e escondido mas dá-se a conhecer, manifestando-se através de sinais, diferentes conforme a sensibilidade, as expectativas e a situação espiritual das pessoas a quem de destinam.
Mas esta manifestação de Jesus não é triunfal: é directa e humilde. Não se impõem mas pede uma resposta livre. Por isso, muitos não O conheceram.

2.2. Jesus manifesta-se de modo adaptado aos destinatários
Procuremos, no modo como Jesus se manifestou, esclarecer como Deus se dá a conhecer ainda hoje. Analisemos de perto três etapas da manifestação (ou Epifania) de Jesus:
a) Aos Magos, Jesus dá-se a conhecer por um astro do firmamento. É hoje aceite por astrólogos e estudiosos de renome que o episódio da estrela de Belém tem um fundamento científico. De facto, segundo os cálculos do célebre astrólogo Kepler, hoje confirmados, por altura do nascimento de Cristo sucedeu um fenómeno astral muito significativo e visível em todo o Mediterrâneo: a conjugação do planeta Júpiter (o astro dos dominadores do mundo) com o Saturno (o planeta protector de Israel) na constelação dos Peixes (o signo dos «tempos finais» ou da era messiânica). A interpretação deste fenómeno astral orientava para o anúncio do nascimento do Messias que devia chegar de Israel.
b) Ao povo de Israel, Jesus manifesta-se pelo cumprimento das profecias. É um aspecto muito realçado pelos primeiros evangelizadores – os apóstolos. Eles apresentam Jesus como Messias a partir do cumprimento das profecias (Lc 24, 27). Será ainda hoje válido este argumento?
c) Aos seus discípulos, e também ao povo que n`Ele acredita. Jesus manifesta-se por sinais. As suas acções e o seu estilo são sinais que revelam o mistério da Sua Pessoa.

3. SINAIS DE DEUS ACTUAIS

3.1. Sinais de Deus hoje visíveis

O Deus invisível e transcendente, para se revelar aos homens e mostrar-lhes o significado da Sua presença e do Seu amor salvador, serve-se de sinais acessíveis, adaptados à condição humana. Através deles «faz sina» aos homens de vários modos: através dos caminhos da natureza, da humanidade, dos acontecimentos históricos e pessoais.

a) Sinais objectivos
. Criação do universo: «os céus proclamam a glória de Deus, o firmamento anuncia as obras das Suas mãos» (Salmo 19).
. Jesus Cristo: a vida e o estilo de Jesus são inexplicáveis, ou mesmo impossíveis, sem Deus. Qual o segredo da Sua originalidade e profundidade, da Sua liberdade e serenidade e sobretudo do Seu amor total ao serviço de Deus e dos homens com preferência pelos mais pobres?
A explicação mais credível é a que Ele próprio, e os que n`Ele crêem, apresentam: vem do Pai, está com o Pai, vive e morre para o Pai.
. Sagrada Escritura: Como poderia surgir este livre maravilhoso com um conteúdo tão elevado sem a intervenção (inspiração) de Deus? Como explicar tantas afirmações, hoje tidas como património universal, mas afirmações, hoje tidas como património universal, mas provenientes da Bíblia e revolucionárias na época e no contexto em que surgiram, tais como: o monoteísmo face ao politeísmo do mundo antigo: o universo criado com ordem e beleza e orientado à perfeição final: a dignidade e responsabilidade de cada homem e de cada mulher face ao determinismo, ao racismo e escravatura das antigas civilizações; a visão ética fundamentada na justiça e na liberdade face aos interesses egoístas, à opressão dos poderosos e à lei do mais forte então vigentes; as profecias do Antigo Testamento realizadas no Novo, como vimos atrás?
. Igreja Católica : Também esta instituição antiga, porventura a mais antiga da humanidade, formada por homens pecadores, não poderia subsistir durante dois milénios, apesar de tantas perseguições do exterior e de tantas divisões de seitas no seu interior, sem a força divina em que acredita estar fundada. A fidelidade firme que conserva às origens, a capacidade de renovação que mostra face às mudanças das civilizações, os frutos que gera de caridade e santidade, de serviço ao homem e conversão pessoal são inexplicáveis sem Deus. A mensagem de Salvação que propõe e na qual acredita, e o compromisso com a transformação do mundo e da humanidade que mostra, são sinais de que continua a missão de Jesus.
. Testemunho de santidade dos cristãos. A vida de muitos cristãos, transformada pela graça, manifesta também a presença de Deus. Assim o confessava um filósofo convertido: «Os encontros (com os cristãos) tiveram uma função capital na minha vida… conheci pessoas nas quais senti a realidade de Cristo de modo tão vivo que não me foi permitido duvidar» (Gabriel Marcel).

b) Sinais na vida de cada um. Santo Agostinho, depois de convertido, recorda a vida passada e reconhece o rosto, suave mas perceptível, da presença de Deus. Um dia, ainda desorientado no pecado, sentiu um convite interior misterioso «toma e lê». Pegou o Novo Testamento e leu as palavras que foram a chicotada decisiva: «Não vos deixeis conduzir pela carne e pelas suas concupiscências».
Confessa depois: «Tarde Vos amei, ó beleza tão antiga e tão nova. Tarde Vos amei! Vós estáveis dentro de mim mas eu estava fora, e fora de mim Vos procurava; com o meu espírito deformado, precipitava-me sobre as coisas formosas que criastes. Estáveis comigo e eu não estava convosco. Clamastes, chamastes e rompestes a minha surdez. Brilhastes, resplandescestes e dissipastes a minha cegueira…» Só depois da conversão este santo encontrou a paz do coração que debalde tinha procurado nos afectos terrenos, e concluiu: «Fizeste-nos para Ti, Senhor, e o nosso coração não tem paz enquanto não repousa em Ti».

3.2. Deus dá-se a conhecer a quem O procura
Deus manifesta-se de modo discreto e humilde e não de modo triunfal. Não apresenta provas evidentes mas oferece sinais. Os sinais são visíveis, orientam e indicam o caminho mas não provam. A fé é sempre uma decisão livre. Como dizia Blaise Pascal: «Há suficiente luz para quem quiser acreditar e há suficiente escuridão para quem não quer crer». Na verdade, quem acredita encontra sempre razões suficientes para acreditar. E quem não acredita também encontra razões para justificar a incredulidade.
Assim Deus permanece um mistério escondido, que procuramos às apalpadelas, e ao mesmo tempo dá-se a conhecer por sinais. Na medida em que procuramos a Sua face Ele dá-se a conhecer: «O Senhor está convosco, assim como vós estais com Ele. Se vós O procurardes, encontrá-Lo-eis, mas se vós O abandonardes, Ele abandonar-vos-á» (2 Cron 15:2).
Como afirma Messori: «Só um Deus escondido é que pode instaurar com os homens uma relação de liberdade e não de necessidade».
A. Marto - M. Pelino

Oitavo encontro: Jesus Cristo Messias esperado

1. ESPERANÇA DE SALVAÇÃO

O Natal é uma festa com um significado humano muito rico a que as pessoas dão muita importância. Que significa o Natal para o comum das Pessoas?
Estes valores humanos revelam expectativas profundas de todas as pessoas.
Então porque não fazer Natal todos os dias, ou seja, porque não viver permanentemente estes valores?
Os homens desejam e procuram a salvação. O desejo de amor, de paz, de luz, de encontro, mostra a esperança de salvação. Por outro lado, as pessoas mostram-se incapazes de alcançar a salvação pelos seus próprios meios. Precisam de um salvador que as venha libertar dos seus impedimentos frutos do pecado.
Esta é a constatação e a esperança que percorre o Antigo Testamento, como temos vindo a reflectir.
Esse período da história da Salvação é atravessado pela expectativa da intervenção de Deus que há-de, no futuro, ajudar os homens a encontrar caminhos de paz, de fraternidade. Deus promete, através dos patriarcas e dos profetas, que há-de enviar o Seu Ungido a trazer a Paz e a salvação a todos os homens.

2. JESUS CRISTO REALIZA AS PROMESSAS DO ANTIGO TESTAMENTO

2.1 A vinda de Jesus realiza as profecias do Antigo Testamento
O Antigo Testamento aparece como um movimento de esperança orientado para um acontecimento que há-de transformar os homens e o mundo. Este acontecimento concretiza-se na vinda de um personagem misterioso que há-de surgir da humanidade mais simultaneamente vem de Deus. Como diz Isaías: «Desça o orvalho do alto dos céus e as nuvens chovam o Justo. Abra-se a terra e germine o Salvador» (Is 45:8).
Encontramos muitas profecias do antigo Testamento que se referem a este enviado de Deus que há-de trazer a salvação aos homens. Podemos lembrar duas: Daniel 7:13-14 e Ezequiel 34:11-16; em Daniel vemos a descrição surpreendente dum personagem que vem de Deus, embora semelhante a um ser humano, para realizar o reino eterno e universal. Em Ezequiel é a promessa de que o próprio Deus virá em pessoa cuidar do seu povo, como um pastor cuida do rebanho.
É Jesus Cristo quem realiza estas promessas do Antigo Testamento. A Sua vinda constitui esse acontecimento que marca a história dos homens.
O nascimento de Jesus Cristo veio realmente inaugurar uma nova época. Ele tornou-se membro da humanidade, inseriu-se na nossa vida, caminha connosco. O seu nascimento marcou de tal modo a história que se tornou o seu centro. Nós contamos, na verdade, o tempo a partir do nascimento de Jesus. Quando dizemos 1950 queremos indicar que Jesus nasceu há tantos anos. A história divide-se em «Antes de Cristo» e «Depois de Cristo».

2.2 Jesus Cristo vem na plenitude dos tempos
A vinda de Jesus realiza-se, assim, depois de um longo período de espera e preparação. Ele é, na verdade, o Desejado das nações, o Messias esperado no Antigo Testamento, o Salvador anunciado e preparado pelos Profetas. A história da Salvação, iniciada com Abraão, orienta-se para Jesus. As diversas etapas do Antigo Testamento (revelação a Abraão; Êxodo; aliança do Sinai; instalação em Canaan; exílio e regresso) preparam a vinda de Jesus.
Deste modo podemos compreender muitas expressões do Novo Testamento que se referem à plenitude dos tempos, como por exemplo: «Ao chegar a plenitude dos tempos Deus enviou o Seu filho, nascido da mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que se encontravam sob o jugo da Lei» (Gal 4:4-5).
Que significa plenitude da Lei? Refere-se às etapas de preparação percorridas no Antigo Testamento. Jesus veio na plenitude dos tempos e trouxe a plenitude da graça e da verdade, (Jo 1:14) ultrapassando o período da Lei (Antigo Testamento): «A Lei foi dada por Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo» (Jo 1:17). Com Ele tornou-se definitiva a Revelação (Heb 11:1).
Ao inserir-se na história humana, ao fazer-se homem com nós, Jesus Cristo transformou realmente a condição humana, iluminando os homens com a Sua luz divina, oferecendo-nos a Sua própria Vida, tornando-se o Caminho, a Verdade e a Vida. «Da sua plenitude todos nós recebemos graça sobre graça» (Jo 1:16).

2.3 Jesus Cristo vem trazer-nos a salvação de Deus.
As expectativas de salvação, que analisamos no início do encontro, ajudam-nos a compreender o significado de Jesus Cristo para todos os homens: Ele vem trazer a Luz e a Vida, a Paz e o Amor. Ele pode, portanto, tornar possíveis as expectativas que vêm ao de cima na quadra natalícia. Ele pode dar corpo e realização ao sonho de um mundo novo de Paz e de Amor. Assim compreendemos a mensagem de Natal dada pelos anjos aos pastores de Belém: «Anuncio-vos uma grande alegria que o será para todos o povo: Hoje, na cidade de David, nasceu-vos um Salvador que é Messias Senhor» (Lc 2:10-11).

2.4 Jesus Cristo torna Deus presente entre nós.
Jesus Cristo não vem apenas dar resposta aos nossos anseios humanos. A salvação que Ele nos oferece ultrapassa as nossas expectativas. Os caminhos de salvação que Ele nos propõe fogem aos nossos esquemas; o Seu nascimento e a Sua vida constituem para nós um mistério, representam uma novidade em relação a tudo o que podíamos prever.
Como se explica que Jesus traga assim uma tal riqueza e novidade à história humana? Explica-se pela sua condição: «N’Ele estava a vida e a vida era a luz dos homens… O Verbo era a luz verdadeira» (Jo 1:4). Jesus era de condição divina: «Deus enviou o Seu Filho». Por isso, tinha a plenitude da perfeição.

No entanto apresentou-se como homem humilde, simples e pobre. «O Verbo fez-se carne e habitou entre nós e nós vimos a Sua glória, glória que lhe vem do Pai como Filho único».
Este mistério de Jesus Cristo, Filho de Deus e Deus como o Pai, que veio até nós em figura humana, é o acontecimento que celebramos no Natal. Ele desceu até nós para caminhar connosco e nos elevar até Deus. Fez-se pobre para nos enriquecer (2 Cor 8:9). Fez-se homem para dignificar a humanidade e aproximar-nos de Deus (Ler Jo 1:16-18).
É portanto, em Jesus Cristo que a história encontra sentido e dignidade. Assim, a nossa preocupação deve ser a de restaurar tudo em Cristo: «reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas que há no céu e na terra» (Ef 1:10). Ele é o Alfa e o Ómega, o princípio e fim de toda a história. (Cf Ap 22:12-13).

3. CELEBRAÇÃO LITÚRGICA DO NATAL

3.1 O Natal é preparado pelo Advento

A celebração do nascimento de Jesus no Natal é precedida de um tempo litúrgico em que se revive a esperança e a preparação do Antigo Testamento para a vinda de Jesus. É o tempo do Advento, constituído por quatro semanas. Esta quadra do Advento procura despertar em nós o desejo da vinda de Jesus e preparar o nosso coração para O escolher. Apresenta-nos algumas figuras do Antigo Testamento que nos convidam e ajudam a preparar a vinda de Jesus. Ocupa um lugar de relevo o profeta Isaías que nos anima na esperança «não temais; aí vem o vosso Deus». Aparece, também, João Baptista que nos desafia a preparar os caminhos que levam a Deus. Em terceiro lugar, aparece aquela que colaborou mais de perto na vinda de Jesus: Nossa Senhora.

3.2 O mistério do Natal narrado nos evangelhos
O Nascimento de Jesus não é apenas um acontecimento social. É o Mistério da presença de Deus em forma humana. É a realização do desígnio de Deus de salvar a humanidade. Por isso, a narração deste acontecimento nos evangelhos é muito rica e diferente em cada evangelista. Cada um colhe o Mistério numa perspectiva própria. No conjunto, enriquecem-se umas às outras. Vimos a perspectiva de São Paulo (Carta aos Gálatas e Carta aos Filipenses) e outra, mais teológica, de São João.
A narração mais sugestiva e mais movimentada, e talvez também a mais conhecida, é a de São Lucas. Este evangelista dedicou um relevo especial à infância de Jesus e, por isso, o denominamos «Evangelista da infância». Os diversos acontecimentos que São Lucas narra sobre a infância de Jesus foram resumidos pela piedade cristã em cinco mistérios (cinco episódios em que se manifesta o mistério de Jesus já presente na infância): anunciação; visitação; nascimento; apresentação; perda e encontro de Jesus no templo.
Nas várias e diferentes narrações encontramos sempre referência a duas dimensões do mistério de Jesus: descendência da humanidade e proveniência divina.
A. Marto - M. Pelino